quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

DIOGO GODINHO - PORTUGAL

De súbito, já estava à porta. As ruas da madrugada vieram-lhe habitar os escombros da isolação. Saiu à luz da alba. Cruzou avenidas, arrancou cruzamentos, destapou ruas-ruelas, entranhou-se nos pulmões da cidade. Respirou. Em cada baque agarrou as mãos ao batimento da urbe. Os carros não passaram, as avenidas não se cruzaram, as passadeiras ficaram inertes à espera do próximo trauseunte. Da cidade, o coração-baixa ficou estanque. Inundaram-se de pálido todas as praças. Ninguém passou. Os semáforos pararam. A sinalização dos semáforos comandou o destino para onde já ninguém ia. Havia vermelho de sinais em progressão estática no tempo. As luzes fecharam-se. Mergulhou na cidade.

De súbito, abriu a porta. Apagou as luzes que restavam da última noite. Fez-se ruído a bater nas orelhas do silêncio que habitava as estradas. Saiu para a consumação do posterior dia. Despiu-se dos escombros que o isolavam. Agarrou na coragem, guardou-a na algibeira e acendeu um cigarro. Lentamente, a digressão dos seus passos chacinou o peso da atmosfera que o engolia. Saiu para fora de tudo. Saiu de casa. Percorreu a efeméride da urbe de uma ponta à outra. Os seus olhos-de-lava evaporaram-se na submissão dos candeeiros. Queimou as luzes. Acendeu de óleo novas estações. Disparou os motores em inércia. Fechou os olhos. Dentro de si, recriou novamente a cidade.

De súbito, cessou o sonho. Em distância, fechou a câmara da rodagem nocturna. Colou as sequências, uma a uma, calçada atrás de calçada na figuração geométrica do seu puzzle de sonhos. Juntou as visões, e o meditar sobre elas. Havia sobriedade a passar no seu painel de vigília. Guardou os livros na estante. Abriu a casa ao exterior. Em retardo, o sémen da estrela de todas as manhãs veio iundar a casa. Arrumou a um canto, o ébrio sonho em garrafas da noite anterior. Despiu-se da sua manipulação de genesis num retrato de urbe ao relento no fim dos dias. Não procriou. Abriu a janela. Lá fora, de súbito, havia uma cidade em concrecto.


Diogo Godinho

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